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Mostrando postagens de 2018

Insight (áudio, poesia)

Matilha

Dia desses era tarde da noite e nós saímos pelas ruas e corremos e brincamos como corriam e brincavam os filhotes dos cães nas ruas. Saímos pelas ruas em busca de liberdade e de subversão à ordem apodrecida. Esses dias nós saímos como sempre fizemos: cada um era líder da matilha; ninguém era líder de ninguém. E brincamos e rimos. Ah, como nós nos rimos! E fomos também ao rio e nos despimos por completo. Brincamos de rinha de galo: Eduardo montava Gustavo, eu montava Renato. Encara, empurra, soca, imobiliza, arranha, faz cócegas… Falávamos “putarias”. Cada frase dita em que sugeríamos coisas entre o amigo e outro cara vinha acompanhada de um sonoro “OOOUAAAAAAA!” ** com cada vogal muito bem pronunciada, obrigado. Éramos irmãos: saíamos juntos, dormíamos juntos, descobrimos quase tudo juntos. Éramos coroinhas na igreja, às vezes eu usava a batina de Eduardo, às vezes era Eduardo que usava a minha… E aos poucos nossa matilha foi se dispersando. Eduardo foi morar fora, Gustavo e

Vênus em Áries (conto)

Tenho saído com o mesmo cara já faz um tempo… É namoro? Não é?... Ele é gentil, um tipo interessante. Tá ali descrito num poema que escrevi aqui, num conto acolá. A gente acaba e ele vai embora, a gente goza e logo dá a hora… Por um tempo pensei que ele era de personalidades múltiplas, mas não… Existe um padrão e percebi que sempre volto pra esse mesmo cara: cabelos cacheados, pelos, barba, brinco, tatuagem, ouve música alternativa, politicamente de esquerda, maconheiro… Não que seja ruim voltar pra esse cara. Pelo contrário: eu gosto. Mas é que eu não tinha planejado uma união estável agora… O destino sempre nos coloca cruzando as mesmas esquinas, mas o alinhamento dos planetas sempre nos põe em tempos distintos. Como um relógio quebrado que acerta a hora duas vezes ao dia, nossos ponteiros algum dia se alinharão no tempo? Vênus em Áries… A desculpa é sempre de ordem metafísica, mas a física concreta dos fatos é que a gente só se vê na surdina, no escuro, casualmente,

Estudando as estrelas III

que noite maravilhosa de incontáveis estrelas no céu! vão até o limite do horizonte de incontáveis estrelas no asfalto. olho para cima e sei que são exatamente as mesmas de há quinze anos, quando já estavam mortas - insistem os cientistas. mas não sei porque me surpreendo, entra nuvem, sai nuvem, me encanto. e o pior é que são as mesmas! exatamente as mesmas! pras estrelas do asfalto abriram ruas - aqui, ali... mas as do céu... essas não mudaram! mudou a minha miopia, que já não dá conta... mudou meu sentimento, que com o vento se expande. mudaram os meus medos, que já não são mais os mesmos; mudou-se pra cá a saudade: eternidade. Arnaldo Ventura (Estudando as estrelas II)

sexo kamikaze

fodo para desfazer o enfado e, não raramente, "falo". - de fedor quase cheiro, na verdade, um cheiro fálico. mil demônios dentro de mim. à direita da minha consciência o seu filho se senta, carregando consigo o fardo. na praça, o duque de farda, a distinção militar que me falta... e é sem disciplina que o faço, ao contrário, sou bagaço; de moral falida, de honra ferida; faço com sete, com cinco, com quatro, no mato, na rua, no quarto, me sujo, me deito, me mato - aos poucos - mas à rotina sempre volto e trabalho feito um louco. Arnaldo Ventura Fica mais! Leia aqui 'Estudando as estrelas II'.

Antologia poética CNNP. Compre a sua!

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Estamos com estoque da antologia Concurso Nacional de Novos Poetas (CNNP), da Editora Vivara, onde fui selecionado com menção honrosa na 16ª colocação dentre mais de 3.000 poemas inscritos! O poema selecionado (de minha autoria) se chama "Diário de bordo". Além disso, você pode conhecer a comunidade de novos poetas. Afinal, ninguém nasce pra poesia já no patamar dos grandes! Um exemplar sai a R$50,00. Quer adquirir o teu e dar aquele apoio à literatura? Então deixa a tua mensagem e pega comigo! Mais uma vez, gratidão!

Antologia poética "Poesia Agora" à venda!

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Estão à venda alguns exemplares da antologia poética Poesia Agora, da Editora Trevo, na qual fui selecionado com a poesia "O dilema do viciado". O livro está lindo! Até a capa, por sorte, eu diria, fala diretamente com as imagens descritas no texto, já que podemos observar um céu com tons crepusculares. Em "O dilema do viciado", começo narrando sobre o céu do Rio Grande do Sul, onde morei por alguns anos. Lá era possível ter a claridade do dia até as 21h nos verões, com belos tons de azul e púrpura. Claro que não pude desperdiçar esse "insight" inicial (ideia ou compreensão repentina), dando vasão a outras ideias que se desenrolaram verso após verso! A comissão avaliadora da Editora Trevo gostou e incluiu meu poema nessa antologia, que, modéstia às favas, está muito boa! Este livro fica pelo preço de R$40,00. Se você mora em Sete Lagoas, fica mais fácil agendarmos em algum lugar no centro, mas se mora em outra localidade, podemos combi

ouço

tenho um problema de audição. não de surdez, mas de audição: eu ouço demais... ouço o tempo, ouço o vento, ouço o ar e o eco a um passo do rompimento. ouço o som dos objetos caindo com a força do vendaval, ouço diabos de gravata ou batina prevendo o apocalipse no final. ouço as iscas dos telejornais, a taquicardia e a tensão das massas; ouço o chicote nas costas do fraco o tapa nas costas do amigo no abraço. ouço estranhos no trem, ouço o silêncio. por deus e pela terra que me comerá: eu ouço até o silêncio! ouço meus medos, ouço meus monstros, ouço e recito meus modos, meus mantras. até o sussurro dos mortos eu ouço; da criança que fui, o soluço, a gota na mesa: uma lágrima; o atrito entre esta e a próxima página; do calor que resta, o crepitar da chama da madrugada em claro, o estalido de minha cama. Arnaldo Ventura Gostou deste poema? Adquira 'Refluxo: poesias escolhidas' clicando aqui  e conh

E quanto a antes da primavera? (poesia)

Como pode um poeta atravessar sua existência sem lançar-se no porvir? De que me adiantaria sê-lo se eu partisse calado? (a voz que escreve sobrevive) Penso em tudo que eu poderia, que eu diria, que eu seria, mas não há futuro               - do pretérito que esgote É que no fim de toda vida, inevitavelmente há morte. Confesso que não lhas entendo: nem a primeira, nem a segunda e percebo que já estou escrevendo, cumprindo meu intento, uma mensagem bem assim fiel ao que eu fui (ou ao que eu sou, não sei) Eu tenho sim muito amor e muita vida o que sinto não é nostalgia é dor de vida bem vivida          de todas as personas que interpreto. E no disse-me-disse, Pessoa, que não se importava nem que dançassem ou rezassem latim, no fim, deixou o mais lindo epitáfio - coisa estranha pra quem não se importa. Acontece que nem ele, naquele tempo, nem eu, em presente que logo será outrora, sabemos do depois da porta. A

Da Terra para Marte, com amor:

Não sei como o tempo passa em Marte, nem como aí percebem o espaço. Não sei como seus corpos interagem - se é que têm corpos. Como, então, eu poderia dar-te um abraço ou desejar-te o equivalente a uma manhã ensolarada de céu limpo coração aberto ouvidos atentos à distorção do som da guitarra psicodélica de uma faixa aleatória que ouvi/cheirei e com isso me inspirei a deixar-te esse recado da Terra para Marte ou em qualquer parte da Lua você esteja? Arnaldo Ventura

Vai pela sombra! (poesia)

Ninguém nunca lhe disse, menina, que você era muito nova pra sair sozinha nesse deserto? (Antes fosse num bosque...) que no deserto, embora as noites sejam frias, os dias são escaldantes e intermináveis? que estamos sempre à procura da próxima sombra e da próxima e da próxima porém, vivendo de oásis nessa lembrança-jeito de ter em mente o elemento água - desejo recorrente mas impossível de saciar? Já entendi que não lhe disseram, menina, e a todo canto que olho - à sua procura - vejo apenas deserto e a cada fresco abraço ainda sob a regência de Morfeu, desperto com a consciência de que não há água nova: tudo não passa de miragem. Mas não seria esse deserto a representação do que penso? Se for o que penso, ora, não importa, porque o que penso não é o que é, mas apenas o que penso. Portanto, vire-me as costas (se quiser), pois o seu tempo é de outras portas e de solos férteis. Eu só lhe peço, com todo o meu amor: